sábado, 21 de setembro de 2013

Inteligência Humilhada

Por Danyllo Gomes


Antes de tudo é importante entender que Inteligência Humilhada é uma condição intrínseca do ser humano. A inteligência do homem não se torna, ou foi um dia, na verdade ela É humilhada por natureza, pelo menos no que diz respeito ao conhecimento de Deus. Como o homem pode conceber o conhecimento de Deus? Através da sua próprio inteligência e sabedoria? Através do que ele pensa e acha que Deus é? Com certeza não! O único meio que o homem pode conhecer a Deus é através do que ele mesmo revelou de Si, as Escrituras Sagradas. Portanto, logicamente se conseguirmos entender toda a Escrituras Sagrada, entenderemos tudo a de Deus. Com certeza não! As Escrituras nos revelam tudo o que Deus revelou de si mesmo ao ser humano. A única fonte confiável sobre a pessoa de Deus são as Escrituras. Nunca será a inteligência ou imaginação do ser humano que trará o conhecimento verdadeiro de Deus. É verdade que temos conhecimento de Deus incutido na nossa mente, mas por causa do pecado o único meio que pode-se conhecer o Deus verdadeiro, sem mentiras ou invenções humanas, é nas Sagradas Escrituras.

O homem, por sua própria força conseguirá estudar as Escrituras como estuda a língua portuguesa e conseguirá compreender tudo? Sem a graça de Deus não. O homem não conhece verdadeiramente a si mesmo, quanto mais a Deus?! Deus que é um ser infinitamente maior, poderoso, não depende de ninguém nem de nada, auto existente, rei de tudo e de todos, criador dos céus e da terra, gracioso, fiel. O homem não pode compreender a Deus como Ele é, antes que Ele se revele a esse homem dizendo-o quem Ele é. O homem precisa de Deus para compreender a si mesmo, quanto mais para compreender o próprio Deus? A inteligência do homem está cativa ao Senhor e à Sua vontade.

A partir daqui nos torna visível o conceito de “monergismo”. Monergismo, normalmente aplica-se apenas a definição de salvação. Quando afirma-se que a salvação é monergística, significa dizer que esse ato depende apenas de uma pessoa, a saber, Deus. Portanto, na salvação, quando se fala de monergismo, se fala da salvação depender apenas de Deus, e não do homem. Depende do livre-arbítrio de Deus, e não do homem. Esse mesmo termo pode ser empregado no conceito de inteligência humilhada, onde vai significar que o ato de conhecer a Deus depende apenas Dele, e não do homem. Para que o homem entenda a Deus ou o conheça, antes, através do Espírito Santo, o Senhor na Sua graça abrirá os olhos só homem, e o próprio Deus se revelará ao homem como Ele realmente é. Portanto, não é uma “via dupla”, pelo contrário, é única. Através apenas do próprio Deus é possível chegar ao conhecimento Dele.

A partir daí ver-se a necessidade de fazer teologia Diante de Deus (Coram Deo).O teólogo não vai apenas acreditar com o intelecto, mas vai vivenciar na prática essa verdade aprendida pelo através do raciocínio. Isso leva o teólogo a fazer teologia com temor e tremor diante de Deus. Ele sabe que Deus está ali, e então ele se dedica o máximo a compreendê-lo e a ensiná-lo da forma devida. O teólogo não vai se preocupar com o que ele acha ou pensa, mas com o que ele ver revelado nas Escrituras, que é a vontade de Deus para sua vida. Dessa forma, aprende-se a respeito de Deus como Ele realmente é, e como ele se revela. O teólogo sempre se achegará com humildade e seriedade para aprender a respeito de Deus.

O teólogo não duvida do seu amor por Deus, pelo contrário, ele O ama sem exitar. E esse amor não fica apenas no intelecto, mas desce para o coração. A certeza deste amor impulsiona-o a aprender mais Dele e querê-Lo mais e mais. Impulsiona-o a viver do modo que O agrada. A teologia 'coram deo' e o amor para com Deus não são vacilantes, são constantes. Não há dúvidas, há certezas. E o teólogo tem a consciência que só ama a Deus porque Ele o amou primeiro. O amor do teólogo é uma resposta irresistível ao amor que Deus tem por ele.

Soli Deo Gloria.  

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Senhor, preciso de tua graça.



Senhor, não é soberbo o meu coração[...]”
Salmos 131:1a


A quem minha inteligência está cativa?
Javé é Teu nome.
Tu existes, sempre existirás,
e eu, o que sou? [1]
Do pó me criastes, fizestes-me para Ti,
o que sou diante de Ti?

Tu existes, sim, eu sei que existes.
Faz-me existir em Ti! [2]
Não existirei fora de Ti, pois um dia voltarei ao que era e não poderei fazer nada a respeito.
O que sou eu, sem Ti?!

Pai, revela-Te a mim como Tu és.
Pai, revela-Te a mim como desejas.
Senhor, não me conheço totalmente, quanto mais a Ti?
Como poderei conhecer-Te, se nem a mim mesmo conheço?
Não há nada em mim que Tu não saibas e quanto há em Ti que eu não sei!
Dependo de Ti, para saber que sou.
Dependo de Ti, para saber quem Tu és.

Minha mente se limita a mim!
Como Te verei? Vens Tu a mim, e livra-me de mim mesmo.
Envia-me Teu Santo Espírito, liberta meus pensamentos e os torna escravos de Ti.
Como conhecerei o que é verdadeiro, se Tu não me mostrares? [3]
Quando Te conhecer, para que me servirá o Teu conhecimento?
Não para mim Senhor, mas para Ti! [4]
Quem sou eu para achar que sou suficiente sem Ti?
Passarei a eternidade conhecendo-Te, e nunca se esgotará o Teu conhecimento. [5]

Assim como penso, necessito falar.
O que falarei, se Tu de tudo já sabes?
O que pensarei, se Tu já sabes?
O faço por mim, e não por Ti.
E quando o faço, não me humilho falando-Te o que já sabes?

Senhor, preciso de tua graça. [6]

[1] – Tg 4:14
[2] – Rm 11:36
[3] – Jo 8:32
[4] – Sl 115:1
[5] – Jo 17:3; Rm 11:33

[6] - Sl 25:1; Sl 141:1

Danyllo Gomes

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Fervor Sem Conhecimento



Charles Spurgeon

Não aceitem o conceito que o mero fervor sem conhecimento bastará, e que as pessoas hão de ser salvas simplesmente por nosso zelo. Receio que somos mais eficientes em calor que em luz; mas o fogo que não tem luz é de natureza suspeita e não vem de cima. Os pecadores são salvos pela verdade que penetra no entendimento, alcançando assim sua consciência. Como pode o evangelho salvar se não é entendido? O pregador talvez utilize saltos, gritos, golpes e súplicas; porém o Senhor não está no vento nem no fogo; a voz mansa e delicada da verdade é indispensável para penetrar no entendimento e alcançar  coração. A congregação deve ser ensinada. Devemos "ir e doutrinar as nações", fazendo discípulos entre elas; e não conheço maneira alguma para salvar os homens senão que os ensinemos e eles aprendam.
Alguns pregadores, embora sabendo muito, ensinam pouco porque usam uma linguagem elevada. Lembremos que nos dirigimos a pessoas que precisam ser orientadas como crianças; mesmo adultos, a maior dos ouvintes está ainda na infância no que concerne às coisas de Deus. Para receberem a verdade, tem de ser apresentada de modo simples, de maneira fácil de assimilar e guardar na memória. Acaso não têm ouvidos sermões que são peças de oratória, e nada mais? Contudo quando termina, o discurso não satisfez a mente, porque a retórica não alegra a alma. É preciso que não façamos da oratório o nosso objetivo. Alguns são eloquentes por natureza, e não lhes é possível ser outro modo, como os rouxinóis não podem evitar de cantar docemente; portanto, não os censuro, mas os admiro. Não é dever do rouxinol baixar a voz ao mesmo tom que o pardal. Que cante com doçura, se o faz naturalmente. Deus merece a melhor oratória, a melhor lógica, a melhor metafísica, o melhor de tudo; entretanto se alguma vez a retórica embaraça a instrução do povo, seja anátema. Que jamais aluma capacidade ou aptidão educacional ou mesmo algum dom natural que possuamos seja estorvo à compreensão do povo naquilo que transmitimos. Que Deus não permita que a nossa erudição ou estilo obscureça a luz; pelo contrário, que sempre usemos a linguagem singela de modo que o evangelho resplandeça livremente em nosso ministério.
Há grande necessidade atual de transmitir luz porque há muitas tentativas ferozes de apagá-la e obscurecê-la. Há muitos que espalham as trevas por toda a parte. Portanto, irmãos, mantenham a luz ardendo em suas igrejas e em seus púlpitos, e ergam-na diante dos homens que amam as trevas porque favorecem seus objetivos. Ensinem à congregação toda a verdade. Há ladrões de ovelhas que rondam à noite, e se conseguem seduzir alguns do nosso povo é porque não conhecem os princípios do cristianismo. Nossos ouvintes têm uma ideia geral das coisas, mas não o suficiente para proteger-se dos enganadores. Estamos rodeados, não apenas dos céticos, mas de certos homens que devoram os fracos. Não deixem que seus filhos sejam privados de um santo conhecimento, pois há sedutores ao redor que tentam desviar os incautos. Começam chamando-os de "queridos" e terminam afastando-os daqueles que os conduziram a Cristo. Se têm de perder algum dos seus ouvintes, que o seja à luz do dia e não por ignorância deles. tais sequestradores deslumbram os olhos débeis com brilho de novidades e transtornam as mentes fracas com descobertas maravilhosas ou doutrinas surpreendentes, as quais tendem à divisão, à amargura e à exaltação da própria seita. Esforcem-se por mantes a luz da verdade ardendo, e os ladrões não se atreverão a saquear as suas casas.
Feliz a igreja de crentes em Jesus que sabem porque crêem nEle. pessoas que crêem na bíblia e conhecem o seu conteúdo; crêem nas doutrinas da graça e conhecem o alcance de tais verdade; sabem onde estão e o que são, e portanto vivem na luz e não podem ser enganadas pelo príncipe das trevas! Lutem, caros irmãos, para que haja muito ensino em seu ministério. Alimentem sempre o rebanho com conhecimento e compreensão, e que a sua mensagem seja sólida, contendo alimento para o faminto, cura o enfermo e luz para os que estão nas trevas.

Revista Os Puritanos, ANO XVI, Nº 4 : 2008, págs.: 28-29.

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Os Dez Mandamentos e a Ética Cristã

Por Danyllo Gomes


           Antes de tudo, é necessário termos uma coisa em mente: a lei de Deus, os Seus dez mandamentos são divididos em duas tábuas. A primeira diz respeito ao relacionamento do homem com Deus; a segunda nos guia no nosso relacionamento com o próximo. Como os cristãos devem se portar na sua vida diária? O que fazer com as escolhas morais? Como fazê-las e baseada em quê será nossa decisão? Essas são perguntas que, de forma geral, tentaremos responder ao longo do texto. Como os dez mandamentos são bastante extensos e grandemente profundos, não será possível esgotar, de maneira nenhuma, este assunto aqui neste ensaio. A minha intenção então será analisarmos a importância deste tema para o cristão, assim como observarmos o mandamento “Não terás outros deuses diante de mim.”
            A lei é o reflexo da santidade de Deus, da sua perfeição. Através dela podemos ver o que Deus é, e o que nós somos. Aquele (o decálogo) é o padrão pelo qual o caráter de Deus é composto, e pelo qual o nosso é julgado. Nessas dez regras temos conceitos simples, mas abrangentes. Pequenos, mas complexos. Devemos nos achegar à revelação divina da Sua vontade para o nosso dia a dia de forma humilde, sabendo que nada somos e que Deus nos revelará o que lhe apraz nos momentos certos. Podemos ler dez, vinte ou até trinta vezes o decálogo, mas nunca ele será esgotado. O próprio Cristo, no sermão do monte, desenvolve os dez mandamentos e aplica-os ao povo e a nós, através das Escrituras. Devemos então nos curvar de forma humilde, reconhecendo a grandiosidade e santidade do nosso Senhor descrita no Decálogo.
            Tiago Santos coloca sabiamente a definição da palavra “ética cristã”, ele diz: “é o 'modus vivendus' do povo de Deus.” Ou seja, o modo pelo qual o povo de Deus deve se guiar. Salmo 119:105 afirma que a palavra de Deus é lâmpada para os pés e luz para o caminho. Precisamos entender que é extremamente necessário e de tamanha importância que o cristão saiba como viver. A primeira pergunta do Catecismo Maior de Westminster diz: “Qual o fim supremo e principal do homem?” imediatamente ele responde: “O fim supremo e principal do homem é glorificar a Deus e alegrar-se nele para sempre [Rm 11:36; 1Co 10:31; Sl 73:24-26; Jo 17:22-24].” A pergunta é: como viveremos para glorificar e alegrar-se em Deus? Observando a Sua Santa Palavra e vivendo de acordo com a Sua Santa vontade [o modus vivendus do homem].
            Podemos também observar o texto de Romanos 12:2, que diz: “E não vos conformeis a este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus.” Como cristãos, devemos não apenas fazer o correto, mas pensar correto. Não devemos nos moldar ao modelo deste mundo, e muito menos às regras morais deste mundo. Pelo contrário, não podemos nos deixar ser influenciados e nem nos conformar com este mundo, mas devemos renovar nossa mente, dia após dia, para que possamos viver de modo bom, agradável e perfeito, de acordo com a vontade de Deus. Esse é objetivo do homem!
            Outro fator importante que devemos saber é que o cumprimento do decálogo não salva, pelo contrário; ele condena! Ela nos mostra quem somos. Essa é uma diferença central do cristianismo bíblico para as outras religiões. A maioria, senão todas as outras religiões, são movidas por boas obras. As pessoas, para alcançarem o “céu” precisam fazer boas obras e etc. Esse é o pensamento que gira no mundo a respeito do homem. Porém, isso não é o que as Escrituras falam. O homem é impuro, corrupto, miserável, condenado, pecador, manchado, depravado, e tudo mais. Por isso, ele não tem a capacidade de cumprir todo o mandamento do Senhor. O cristão não cumpre a lei de Deus para ser salvo, mas por amor! [João 14:23] O que nos move e capacita a cumprir a lei de Deus é o Santo Espírito. Ele, apenas Ele, pode nos capacitar a fazê-lo.

“Não terás outros deuses diante de mim.”

            Aqui temos um mandamento tão conhecido, e ao mesmo tempo tão negligenciado. Deus diz ao povo de Israel que não tolera diante da Sua face qualquer outro Deus, pois Ele é o único. No contexto da época, o povo estava rodeado de religiões pagãs, onde cada uma reivindicava o seu próprio deus. Na verdade, neste exato momento, o povo tinha acabado de sair de uma cultura onde vários deuses eram cultuados. Cada um na sua “área”. O sol, o rio, a natureza, a vida, e por aí vai. Cada área do ser humano era governada por um deus diferente. Essa era a ideia.
            O povo de Israel, o povo escolhido e separado por Deus, precisava entender que o Deus deles, o Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó era o Deus verdadeiro, hoje e sempre. Infelizmente, essa ideia não ficou presa àquela época. Hoje, não só pagãos, como também cristãos, acreditam “mesmo que sem querer” num deus compartimentado; o qual não é o Deus das Escrituras. Michael Horton coloca da seguinte forma: “Podemos ver em nossos próprios círculos cristãos traços dessa mudança de ideia de um Deus Soberano que revelou-se num tempo e espaço reais na História, para a noção de deidades locais que gerenciam os compartimentos separados de nossa vida, garantindo o sucesso e a felicidade em suas esferas respectivas. Isso é raramente declarado, mas frequentemente praticado: Deus está encarregado da área chamada “religião”, mas a própria vida é governada por um panteão de deidades: carreira, posses, ambição, auto-estima, família, amigos, entretenimento, moda. Sempre que tomamos uma decisão de violar a vontade revelada de Deus em favor de uma dessas “deidades”, estamos colocando outros deuses diante do único e verdadeiro Deus vivo.”[1] Quantas “deidades” não existem em nossos corações querendo tomar o trono do Senhor dentro de nós? Simples coisas do dia a dia nos impedem de adorar a um único Deus, o verdadeiro.
            A cultura brasileira está arraigada no catolicismo romano. Cristãos tem repúdio a imagens por causa dessa cultura donde vivemos e viemos, mas às vezes esquecemos que não só existem ídolos físicos (imagens), mas também os do coração. Pessoas estão tão presas a condenar alguém que adora uma imagem – de forma nenhuma estou concordando com a adoração de imagens – que se esquecem que no seu coração, talvez, exista mais ídolos do que todos aqueles os santos da Igreja Católica Romana. O Senhor neste mandamento não condena somente ídolos visuais, mas qualquer coisa que ocupe o lugar Dele em nossas vidas.
            Salmos 115:1 diz: “Não a nós Senhor, não a nós, mas ao teu nome dá glória, por amor da tua misericórdia e da tua fidelidade.” O povo de Israel que tantas vezes abandonou a Deus por causa de falsos deuses reconhecem a majestade de Deus. Por que será que no início diz-se 'Não a nós Senhor, mas ao teu nome dá glória […]'? Simplesmente porque o coração do homem tem dois deuses, ou o Deus verdadeiro ou ele mesmo. Como já dizia João Calvino: “O coração do homem é uma fábrica de ídolos”. Calvino, como um perspicaz teólogo, entende exatamente o ponto. Se o deus do homem não é o Deus verdadeiro, é ele mesmo. Ele fabrica, seja: religiões, ele mesmo (ateísmo), trabalho, esposa, namorada, dinheiro, sexo, vícios; qualquer um. Fora do Deus santo e verdadeiro - que é aquele que preenche o vazio que o homem tem – não há verdade. Só há pseudo-deuses, tentando ocupar o lugar que não é para eles, e como não é para eles, eles não vão conseguir preenchê-lo.
            No decorrer do Salmos 115:4-8, o salmista descreve como são os deuses das nações ao seu redor: “Prata e ouro são os ídolos deles, obra das mãos de homens. Têm boca, mas não falam; têm olhos e não veem; têm ouvidos, e não ouvem; têm nariz e não cheiram. Suas mãos não apalpam; seus pés não andam; som nenhum lhes sai pela garganta. Tornem-se semelhantes a ele os que os fazem e quantos neles confiam.” Os idólatras se tornam inúteis diante do Deus que está no céu (ver Sl 115:3). Eles são como mortos, são como os deuses que eles adoram.
            C. J. Mahaney no seu artigo[2] observa alguns meios de identificar a idolatria do homem, alguns deles são:
(1) – As Escrituras: como cristãos não só precisamos, como devemos observar toda nossa vida de acordo com as Escrituras Sagradas. Ela é a nossa única regra de fé e prática. É através dela que o Senhor nos ensina como devemos viver. Como disse anteriormente, toda a idolatria do homem flui do seu próprio coração corrupto, e as Escrituras penetra-o e o corta (ver Hb 4:12-13).
(2) – O Espírito Santo: Através da ação divina do Espírito Santo podemos perceber o que está em nosso coração que está tomando o lugar do nosso Deus. Investir tempo em oração clamando a Deus que o ES ilumine nossa mente para identificar e deixar a nossa idolatria.
(3) – Os outros irmãos: através do amor mútuo, da comunhão que desfrutamos através do sangue de Cristo, precisamos confrontar uns aos outros. O nosso coração é orgulhoso e enganoso, e muitas vezes não conseguimos identificar, por nós mesmos, o que está no nosso coração tomando o lugar do Senhor. Portanto, através de humildade precisamos escutar os outros, e através do amor confrontar os outros.
            O Catecismo Maior de Westminster, pergunta 104 diz: “Quais são os deveres exigidos no primeiro mandamento?” Como resposta: “Os deveres exigidos no primeiro mandamento são: conhecer e reconhecer Deus como único verdadeiro Deus, e nosso Deus; adorá-lo e glorificá-lo como tal; pensar e meditar nele; lembrar-nos dele, altamente apreciá-lo, honrá-lo, adorá-lo, escolhê-lo, amá-lo, desejá-lo e temê-lo; crer nele, confiando, esperando, deleitando-nos e regozijando-nos nele; ter zelo por ele; invocá-lo, dando-lhe louvor e agradecimentos, prestando-lhe toda a obediência e submissão do homem todo; ter cuidado de lhe agradar em tudo e tristeza quando ele é ofendido em qualquer coisa; andar em humildade com ele.” Na pergunta seguinte é descrito todos os pecados que são condenados com o primeiro mandamento. De forma singular o Catecismo de Westminster explora as Escrituras quanto a esse assunto. Soli Deo Gloria, Sola Fide, Solus Christus, Sola Scriptura e Sola Gratia; esses brados da reforma ecoam como um funil, onde no início têm-se todos eles juntos, mas no fim, lá no fim do funil, temos uma única coisa: a Glória de Deus.
            Esse primeiro mandamento – não terás outros deuses diante de mim – é nada mais, nada menos que o Senhor dizendo ao Seu povo: 'Toda a glória seja dada a mim! Eu sou o único e verdadeiro Deus, qualquer outro deus é abominação. A glória que seria dada a ele (o suposto deus) é para ser dada a mim!' A glória é Dele, a salvação é dele, o nosso coração deve repousar somente Nele.

Soli Deo Gloria.


Referências:

[1] HORTON, Michael, A Lei da Perfeita Liberdade, Ed. Cultura Cristã, pág. 34.
[2] http://www.monergismo.com/textos/pecado_tentacao/idolatria_mahaney.htm

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Introdução à Teologia Paulina


Por Danyllo Gomes


    Dentro do Novo Testamento (NT) é fato que temos vários escritores. Evangelhos, cartas gerais e cartas paulinas são os livros que temos no cânon do NT. Entretanto há a dúvida de alguns escritores. Em particular, neste texto irei tentar abordar a respeito do apóstolo Paulo de Tarso. Dentre todos os escritores do NT ele é o que mais se destaca, tanto por quantidade, quanto por assuntos abordados. Podemos atribuir ao apóstolo, aproximadamente 60% a 70% do cânon do NT.

Unidade do NT

    Dentro do NT temos vários assuntos de diferentes tipos colocados de diferentes formas. Há pessoas que argumentam a respeito disso dizendo que o fato do NT ter tanta variedade de assuntos faz disso ele (NT) de contraditório. Porém, essas pessoas antes de tudo utilizam o pressuposto errado para analisar a Bíblia. Eles não acreditam na inspiração divina. Portanto, nós que cremos que a Bíblia é tanto humana quanto divina, cremos que todo o NT tem suas diferenças, mas em vez disso torná-lo contraditório torna-o completo e diverso. Não é por que a Bíblia trata de assuntos diverso que ela tornar-se-á contraditória, não é? Portanto, partindo do pressuposto do tota scriptura analisaremos o NT como um texto inspirado e completo.

Quais as cartas de Paulo?

    Antes de sabermos o que analisar precisamos decidir o que analisar. Será que é confiável? Ou não? Essas são as perguntas que fazemos quando vamos estudar a respeito de qualquer outro texto. E isso não é diferente com as Escrituras. Se vamos analisar a Teologia Paulina precisamos saber se a fonte desta teologia é confiável. Se foi o próprio Paulo que escreveu, ou não? Essas são questões que vamos tentar tratar neste ponto.
    Há um nome ao qual podemos definir o corpo de 13 cartas que são atribuídas ao apóstolo Paulo: corpus paulinus. Depois do séc. XVII alguns teólogos começaram a questionar a autoria de algumas dessas cartas que eram atribuídas a Paulo. Alguns deles acreditam que foram escritas por admiradores, outros por imitadores, e por aí vai. Algumas cartas ficaram fora da discussão, elas são: 1º e 2º Coríntios, Romanos e Gálatas.
    Alguns dos pontos levantados para questionar a autoria paulina das cartas ou não são: diferença de vocabulário, diferença de temas teológicos, estilo diferente, eclesiologia muito elaborada para o primeiro século. O Dr. Augustus Nicodemus argumenta da seguinte forma: “se nos lembrarmos que Paulo escreveu ao longo de 15 anos, que usou amanuenses, que suas cartas tratam de diferentes assuntos levantados por diferentes situações e diferentes igrejas, e que a eclesiologia do primeiro século já era bem elaborada...”, se nos lembrarmos disso conseguiremos entender as cartas paulinas sem precisar abrir mão do pressuposto da inspiração do cânon do Novo Testamento.

Qual a fonte da teologia de Paulo?

    De onde vieram as ideias de Paulo? Há alguns temas na teologia de Paulo que só aparecem em sua carta, de onde ele tirou? Por que cultura ele foi influenciado?
    A verdade é que Paulo foi criado em três mundos: hebraico, judeu e grego. Ele foi criado e educado como judeu na cultura hebraica; viveu no mundo grego, na cultura, religião; e pertencia ao mundo romano, o qual era cidadão. Portanto, a partir desse pano de fundo dá pra perceber que Paulo além de ser um homem bastante estudado, também era bastante “rodado”, ou seja, já havia passado por várias culturas e sofria influencia de todos os lados.
    Antes vamos tentar entender como era o judaísmo na sua época. O judaísmo era dividido em duas partes: o da Dispersão e o da Palestina. Os judeus da dispersão não eram tão rigorosos, pois estavam longe do templo, sempre entre gentios e foi muito influenciado pelo helenismo; porém, apesar de tudo, mantinham-se fieis as principais instituições judaicas. Já o judaísmo da Palestina era considerado mais rigoroso por causa do templo, não sofriam influencia do helenismo e nem dos gentios, tinha a presença das seitas da época (fariseus e escribas), porém não podemos fazer uma grande diferença entre os dois judaísmos.
    O fato é que Paulo era um judeu da Dispersão, foi criado em Tarso com uma educação rabínica de primeira qualidade. Ele foi ensinado aos pés de Gamalieu, um dos maiores estudiosos do judaísmo. Portanto, precisamos observar que a mente de Paulo era bastante influenciada pelo Judaísmo.
    Com o passar do tempo, várias discussões acerca do “pano de fundo” de Paulo entraram em cena. Alguns acreditavam que o pensamento de Paulo era basicamente grego, bastante influenciado pelo dualismo grego entre o bem e o mal e as ideias do neoplatonismo dessa época. Outros acreditavam que Paulo era um gnóstico, e que algumas das suas doutrinas, como, por exemplo, a união com Cristo, foram emprestadas das religiões de mistério (religiões pagãs da época). Portanto, quando se estuda Paulo com esse “pano de fundo” eles procuram paralelos com influencias as quais eles acreditavam que Paulo sofria. Entretanto, a fonte real do pensamento de Paulo era o Judaísmo. Por ter sido criado toda a vida no judaísmo da Dispersão, ter morado em locais onde sempre tinha sinagogas, nota-se que Paulo realmente era um judeu. Sua fervente perseguição contra os judeus mostra isso. A conclusão que tiramos é que o pensamento de Paulo estava embasado no Antigo Testamento, a fonte de literatura judaica, a qual ele seguia e acreditava.
    Além da influência do Antigo Testamento não podemos deixar de citar os ensinamentos de Jesus como fonte para a teologia de Paulo também. Em 1 Coríntios 11:23 vemos que Paulo diz que recebeu alguns ensinamentos do Senhor através de cristãos. E também houve a influencia do ensino da igreja apostólica. Em 1 Coríntios 15:3-4 vemos Paulo afirmando que ele “recebeu” os pontos fundamentais da fé. Esse 'receber' significa que através de ensinamentos, através da tradição oral dos apóstolos pelos cristãos, os ensinamentos chegaram até Paulo e ele os conheceu.
    Com isso, fica a conclusão que devemos entender a teologia de Paulo de acordo com: as Escrituras do Antigo Testamento, os ensinos de Jesus e os ensinos da igreja apostólica. Esses são o três principais pilares que se baseiam a teologia do apóstolo Paulo.

Paulo mudou sua teologia com os anos?

    Precisamos ter em mente que Paulo era inspirado por Deus quando escrevia suas cartas; por outro lado também sabemos que ele é humano, portanto ele está sujeito às normalidades da vida humana, como, por exemplo, crescimento intelectual e físico. Como de costume, muitas pessoas mudam suas ideias com o tempo. A pergunta que surge é: será que Paulo mudou seu pensamento com o tempo? A primeira carta que Paulo escreveu não condiz com sua ultima? Ele mudou sua teologia?
    Alguns teólogos acreditam que não podemos falar de uma teologia paulina, mas sim de várias. Eles afirmam que o corpo das cartas de Paulo não se unem, pois são pensamentos diferentes em épocas diferentes. Portanto suas cartas não refletem um pensamento só, coerente e maduro, mas que tem ideias contraditórias.
    Ao mesmo tempo que tem se instalado esse tipo de pensamento no meio teológico do cristianismo, do outro lado temos teólogos conservadores defendendo a posição histórica de que: “Não! Não podemos falar de várias teologias de Paulo, mas sim de uma. Paulo é inspirado por Deus, portanto a Bíblia não contém contradições.” O Dr. Augustus Nicodemus coloca da seguinte forma: “...as supostas contradições apontadas podem e tem sido explicadas como diferentes ênfases motivadas pelo caráter circunstancial das cartas. Por exemplo, a aparente contradição entre uma atitude crítica do apóstolo para com a Lei de Moisés em Gálatas e sua atitude mais amena e branda em Romanos explica-se levando-se em conta a situação em que Paulo escreveu Gálatas – missionários judaizantes querendo obrigar os crentes gentios a guardarem a lei de Moisés para serem salvos - e a situação e propósito da carta aos Romanos – dar uma explicação mais detalhada do Evangelho que ele pregava. Esta explicação é muito mais coerente do que a hipótese de que Paulo teria sido repreendido por Tiago após ter escrito Gálatas e então modificou se pensamento em Romanos, como defendem alguns.”
    Podemos observar que o não falta explicações coerentes contra essas que estão sendo levantadas contra uma teologia unificada do apóstolo. Não só essa que o Dr. Augustus Nicodemus observa, mas muito mais. É fato que Paulo mudou seu pensamento com o tempo, mas esse pensamento não influenciou necessariamente numa mudança de teologia, mas sim de acréscimo. Paulo não mudou sua teologia com o tempo, apenas acrescentou mais conhecimento a ela. Então esse crescimento gradual de conhecimento não implica, necessariamente, numa contradição no pensamento do apóstolo.

Soli Deo Gloria.



sábado, 11 de maio de 2013

Princípios Gerais de Interpretação Bíblica

Por Danyllo Gomes

Da própria Escritura derivam-se alguns princípios para guiar nossa interpretação do texto. É óbvio que nós (seres pensantes) quando vamos a um texto vamos com uma “bagagem”. Nossos pressupostos, princípios que nos guiaram por toda a vida, filosofia própria, estilo de vida, modo de pensar, cosmovisão própria; tudo isso influencia-nos quando vamos entender um texto. Por isso, para termos consciência do que o Senhor nos deu como revelação, precisamos nos apegar a alguns princípios extraídos da própria Escritura, para que através deles, possamos nos esvaziar de nós mesmos e apendermos os ensinamentos do Senhor. Portanto, é de importância central termos consciência desses princípios.

AUTO-INTERPRETAÇÃO DAS ESCRITURAS

Como princípio primário e fundamento temos a auto-interpretação das Escrituras. Esse princípio nos ajudam a entender cara passagem, independentemente de ser uma passagem obscura ou não. A Bíblia interpreta ela mesmo, esse é o significado. Todos os outros princípios dependem desse. Não há sentido em dizer: “passagens mais claras dão lugar a passagens mais escuras” se antes não entendermos que a Bíblia se auto-interpreta. A Confissão de Fé de Westminster tem uma organização bem interessante. No primeiro capítulo ela não fala sobre Deus, nem sobre o homem; ela inicia falando sobre a Escritura. A Escritura é que vai guiar o nosso entendimento quanto a Deus, quanto ao homem, ou seja lá qual for o assunto. Os reformadores seguiram esse princípio ao pé da letra; o lema deles era: “Scriptura, Scriptura interpres.”¹, ou seja, o melhor intérprete para a Escritura é ela mesma.
Esse fundamento nos leva a outro ponto. Precisamos ter consciência que nem a tradição, nem os Pais da Igreja, nem filosofia, nem qualquer outro tipo de influencia pode guiar nosso entendimento a respeito das Escrituras. Ela é a única fonte infalível, inerrante e autoritativa. A quem mais devemos recorrer senão ela?

PRINCÍPIO DA ANALOGIA DA FÉ

Também definido como a harmonia geral das doutrinas bíblicas fundamentais, o princípio da analogia da fé nos apresenta não nos apresenta um conceito concreto, mas Walter Kaiser nos apresenta alguns que pode servir: (1) axiomas ou doutrinas centrais da fé cristã; (2) passagens bíblicas claras. Paulo Anglada a define como: “significa que uma passagem bíblica deve ser interpretada à luz do ensino geral das Escrituras.” ².
Esse princípio - dentre tantos benefícios para interpretação – nos impede de interpretar a Bíblia incoerentemente, fazendo-a contraditória. Se o ensinamento de um texto vai contrário ao ensinamento de outro texto de modo nenhum é porque a Bíblia é contraditória; pode ser culpa de tudo: tradição, capacidade humana, ou qualquer outra coisas, mas nunca a Bíblia. Faço das minhas palavras a de A. W. Pink: “Nenhum verso das Escrituras deve ser explicado de modo que conflita com o que é ensinado clara e uniformemente nas Escrituras como um todo, nossa única regra de fé e obediência. Isto requer do expositor que não apenas um conhecimento do sentido geral da Bíblia mas também que ele se dê a trabalho de reunir e comparar todas as passagens que tratam ou têm relação específica com o assunto diante de si, de modo que possa obter a intenção do Espírito acerca do assunto.” ³
Com base nisso, segue-se alguns pontos que preciso ressaltar. Primeiramente o teólogo precisa ter uma boa base de Teologia Sistemática. Na Teologia Sistemática o estudioso terá uma visão geral das principais doutrinas bíblicas durante toda a Escritura. A Teologia Sistemática não se resume a uma passagem, não se resume a um capítulo, não se resume a um livro; a Teologia Sistemática estuda um determinado assunto durante toda a Bíblia. Mas por que isso é importante? A importância é que além de você saber as principais doutrinas Bíblicas (as que não devem ser quebradas de maneira nenhuma), você também saberá o que toda a Bíblia fala de um determinado assunto. Isso previne o estudioso de cometer qualquer contradição bíblica.
Por outro lado, é de suma importância que o estudioso tenha bastante conhecimento da Teologia Bíblica. Na Teologia Sistemática o teólogo terá um entendimento de uma doutrina de modo geral nas Escrituras; já na Teologia Bíblica o teólogo precisará entender a passagem de acordo com seu contexto. Em vez de estudar a doutrina que aquela passagem passa, ele estudará a passagem, o seu contexto, o seu capítulo e o seu livro. É de vital importância que o estudioso entenda a passagem de acordo com seu contexto. Para que ele extrai o ensinamento do texto ele deve saber o que aquela passagem está falando naquele contexto.
Observando o ensinamento da Trindade como exemplo: em Mateus 3:16-17 diz: “Batizado que foi Jesus, saiu logo da água; e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito Santo de Deus descendo como uma pomba e vindo sobre ele; e eis que uma voz dos céus dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo.” Para que esse texto não entre em contradição e haja uma interpretação consistente o teólogo primeiro deve observar a passagem de acordo com o seu contexto, perguntas como: “onde a passagem se passa? O que está acontecendo? Entre outras...” deve guiar a interpretação Bíblica. Por outro lado, quando o significado é retirado do texto (nesse caso o ensinamento da Trindade) deve-se observá-lo de acordo com todo o ensino da Escritura a respeito dele. No caso do texto, utilizaremos a Teologia Sistemática para entendermos o ensino da Trindade durante toda a Bíblia. Portanto, na interpretação Bíblica a Teologia Sistemática e a Teologia Bíblica precisam ser harmonizadas e usadas como instrumento de entendimento.
Outro ponto importante é o conceito de progressividade das revelação. Precisamos ter em mente que a Bíblia não foi escrita apenas em um momento. Temos vários anos de história antes dela está completa. Portanto, cada escritor estava no seu contexto. É importante então entendermos cada momento da revelação.

PRINCÍPIO CRISTOLÓGICO

Paulo Anglada define esse princípio da seguinte forma: “afirma que Cristo é a chave para a interpretação bíblica, porquanto toda ela, inclusive o Antigo Testamento, se refere a Ele, se concentra Nele e dá testemunho Dele.” 4 Em resumo esse princípio nos diz que Cristo é o centro de toda a Escritura; desde Gênesis até Apocalipse. Seguindo o modelo de Paulo Anglada podemos descrever a relação de Cristo com o texto da seguinte forma (citarei as principais):
(1) Perspectiva neotestamentária: a nossa visão do Antigo Testamento não deve-se reter apenas ao ensinamento histórico das narrativas. Precisamos fazer uma ponte com o Novo Testamento para entender qual o significado que Cristo tem em determinada passagem do Antigo Testamento. Vale salientar que esse tipo de interpretação não muda o sentido do texto, mas aprofunda até chegar a Cristo.
(2) Conceito de aliança: A Bíblia é formada por alianças. Aliança essas que Deus fez com seu povo para que ele se reconciliasse com O criador. A Antiga Aliança é descrita por determinadas características. Como também a Nova Aliança tem suas próprias características. A Escrituras descreve como foi o decorrer dessas alianças, e sempre enfatizando o seu mediador: Jesus Cristo. Os pactos vão ser bem mais claramente entendidos à luz daquele ao qual ele é mediado.
(3) Peleja história entre o descendente da mulher e o descendente da serpente: para entender o personagem principal de toda a Escritura é necessário entendermos como ele surgiu. Em Gênesis já vemos a semente do evangelho. Cristo sendo profetizado através da descendência da mulher. Como entender o decorrer desta história se não apontarmos para Cristo?
(4) Relação entre os ofícios de Cristo. Cristo é tanto sacerdote, quanto rei, quanto profeta. A relação entre esses ofícios, a Escritura e os Alianças é inseparável. Cristo é sempre representado como rei na Escritura; Ele é o sacerdote supremo do Seu povo nos pactos; e Ele é o profeta de Deus diante de toda a terra. “Qualquer referência bíblica aos ofícios profético, sacerdotal e real deve ser interpretada à luz da sua relação com os ofícios de Cristo”, diz Paulo Anglada 5.

TIPOLOGIA

Tipologia é o estudo de pessoas, eventos, objetos no Antigo Testamento (tipos) que prefiguram o há de acontecer (antítipo), ou prefigura algo no furuto. Por exemplo: no Antigo Testamento o sacrifício do povo de Deus era feito através do cordeiro. No Novo Testamento Jesus Cristo “é o cordeiro que tira o pecado do mundo.” Portanto, o cordeiro é a prefiguração do Cristo vivo. O cordeiro é o tipo e Jesus Cristo é o antítipo.
Os “tipos” tem suas características para que ele possa ser identificado, elas são:
(1) Elemento de relação, semelhança ou correspondência: Para que uma pessoa, evento ou instituição seja interpretada como tipo, deve haver um relacionamento de semelhança entre a pessoa , evento ou instituição. Esse ponto é fundamental para a observação da tipologia e sua identificação. Devemos sempre perceber as semelhanças e a relação entre o tipo e o antítipo.
(2) Elemento histórico. Há uma diferença profunda entre tipologias e parábolas. Parábolas não são consideradas tipologias apesar de terem alguma relação. A parábola é mais caracterizada pela correspondência do que pela tipologia. A tipologia tem um caráter histórico no que diz respeito a seu entendimento. Por exemplo, os personagens do Antigo Testamento como Adão, Isaque, Jacó podem ser considerados como tipologias de Cristo, isso porque além da relação de semelhança, é também observado o caráter histórico dessas passagens.
(3) Elemento profético ou prefigurativo. A tipologia também pode ser considerada profética, isto é, sempre intimamente relacionada com um acontecimento futuro. Isso se dá normalmente por conta da Antiga Aliança, onde suas tipologias sempre apontam para algo no futuro, ou seja, para a Nova Aliança. Também considerada prefigurativa por figurar algo futuro e sempre uma relação de semelhança.
(4) Elemento de progresso ou elevação histórica. Como bem sabemos a história da salvação da Escritura é passada de forma progressiva, ou seja, a revelação foi escrita ao longo do tempo, e não pronta num momento específico. Com base nisso podemos afirmar que a tipologia se caracteriza por sempre - dentro desse progresso de revelação – observar a construção e a relação entre personagens ou instituições ou seja lá qual foi o item tipológico.
(5) Intenção divina. Paulo Anglada afirma: “Para que uma pessoa, instituição ou evento histórico seja considerada uma tipológica de realidades futuras, deve haver ainda evidências bíblicas de que Deus realmente tencionou empregá-las como tal.” 6 Esse, particularmente, creio que é o ponto principal. Tudo se baseia na intenção do Senhor. Todas essas características vão estar baseada nesta: foi a intenção do Senhor mostrar determinada pessoa, evento ou instituição histórica como tipológica?

PRINCÍPIO DA INTERPRETAÇÃO DE PASSAGENS OBSCURAS

Esse princípio é derivado do primeiro que estudamos (Auto-interpretação das Escrituras). A principal ideia aqui se refere a como vamos entender um passagem que, por si só, não é tão fácil de ser entendida. É aí que entra esse princípio. A partir do momento que temos uma passagem difícil de ser entendida o que precisamos fazer para obter desta passagem o ensino que ela nos traz de forma clara? Segundo o princípio isso é feito através de textos paralelos.
Através dos textos paralelos é possível fazermos a interpretação correta de algum texto obscuro. Normalmente esses textos paralelos são encontrados em textos do mesmo autor, tonando assim o sentido da passagem obscura mais clara. Portanto, devemos interpretar as passagens obscuras à luz das passagens mais claras.

NOTAS

¹ Introdução à Hermenêutica Reformada, Paulo Anglada, Ed. Knox, pág. 165.
² Introdução à Hermenêutica Reformada, Paulo Anglada, Ed. Knox, pág. 168.
³ Interpretation of the Scripture, Arthur W. Pink.
4 Introdução à Hermenêutica Reformada, Paulo Anglada, Ed. Knox, pág. 179.
5 Introdução à Hermenêutica Reformada, Paulo Anglada, Ed. Knox, pág. 185.
6 Introdução à Hermenêutica Reformada, Paulo Anglada, Ed. Knox, pág. 194.

sábado, 13 de abril de 2013

Olhando o mundo através da cruz - Cosmovisão Cristã

                                    
Por Danyllo Gomes



INTRODUÇÃO

Antes de tudo, é importante entendermos o que é uma cosmovisão e o que é o cristianismo. Entendermos a importância das metanarrativas na vida e como cada pessoa lida com esse fato. Bem, a grosso modo, cosmovisão é o modo pelo qual nós enxergamos a vida; é o modo pelo qual nós julgamos o que acontece ao nosso redor. Portanto, cosmovisão seria um conjunto de crenças que guia nossos pensamentos e nosso modo de viver. Cosmovisão é a base de tudo que cremos e fazemos. Até mesmo aquelas pessoas que se julgam sem cosmovisão, na verdade, a têm. Sistemas de pensamentos como, por exemplo, Aristóteles e Platão são uma cosmovisão.

      A cosmovisão é composta por crenças coerentes e organizadas que nos levam a formar um sistema de ideias. Portanto, nossa ideia da realidade, como a julgamos e como lidamos com ela, é dada pela esquematização das nossas crenças. O filósofo W. P. Alston foi muito feliz quando afirmou que: “Pode ser argumentado, sobre a base de fatos com respeito à natureza do homem e as condições da vida humana, que os seres humanos têm uma necessidade profundamente implantada de alguma figura geral do universo total no qual eles vivem, para que eles possam ser capazes de se relacionar com suas próprias atividades fragmentárias ao universo como um todo de uma forma significativa para eles, e uma vida na qual isso não é perseguido, é uma vida empobrecida num aspecto muito significante.” Querendo ou não, todos nós estamos ligados a uma cosmovisão, resta-nos saber se é uma cosmovisão Cristã (Bíblica e correta) ou não. Dando um exemplo mais prático: cosmovisão é como se fosse os nossos óculos, tudo vemos através deles. Essa é a ideia da Cosmovisão Cristã: é vermos o mundo através de uma visão Bíblica. As Escrituras nos mostram com clareza como devemos ver o mundo, como devemos proceder, quais devem ser nossas ideias e tantas outras riquezas de conhecimento.

      Pessoas que não têm base na cosmovisão correta podem começar a ter ideias erradas e inconsistentes. Se olharmos o mundo através dos óculos errados, consequentemente vamos enxergar coisas erradas. O mesmo acontece com a cosmovisão: se enxergamos o mundo através de uma cosmovisão errada, faremos julgamentos errados das coisas que estão ao nosso redor; o mundo não fará mais sentido pra ele. Por vezes nos pegamos pensando: “Aborto é errado?”, ou “E a pena de morte? Será que é correto?”, ou “qual o objetivo do homem?”, perguntas essas que nos rondam a todo momento e nos levam a tomar decisões. O que influenciará nossa conclusão e pensamento acerca dessas coisas é a nossa cosmovisão. Se for uma cosmovisão sadia, consequentemente vamos ter posições coerentes e corretas; do contrário, teremos sérios problemas.

A COSMOVISÃO CRISTÃ

     Paulo no livro de Colossenses 2:8 diz: “Tende cuidado para que ninguém vos faça presa sua, por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos do mundo e não segundo Cristo”. Como bem sabemos, essa época era a “época da filosofia”. Essa era a época de grandes pensadores. Homens que buscavam entender a vida de modo bastante racional, explicações inteligentíssimas para assuntos tão complicados. Essa era a época onde a igreja a qual a carta de Colossenses estava sendo endereçada. Paulo exorta os cristãos dali a tomarem cuidado para que ninguém os engane com filosofias segundo as tradições dos homens e nem do mundo, mas que eles sigam a filosofia de Cristo. “Mas como é a filosofia de Cristo? O que ele quer dizer com isso?” É aí onde entra a cosmovisão cristã. Quando Paulo exorta os cristãos a viverem pela filosofia de Cristo, significa que Paulo estava mandando eles viverem de acordo com as crenças e o sistema de pensamento que Cristo deixou. Olhar para o mundo como Cristo olhou, viver no mundo como Cristo viveu. E isso não se aplica apenas àquela igreja, serve para nós hoje. Não devemos nos deixar levar pelas tradições dos homens e do mundo, mas sim pela de Cristo. R. C. Sproul escreve que “nenhuma sociedade pode sobreviver, nenhuma civilização pode funcionar, sem algum sistema unificador de pensamento... O que faz de uma sociedade um sistema unificado? Certo tipo de cola que é encontrado num sistema unificado de pensamento, o qual chamamos de cosmovisão”. E essa é a mais pura verdade.
De acordo com o texto de Colossenses visto acima, vemos que há dois tipos de filosofia: a cristã e a não cristã; a de Cristo e a fora de Cristo. Portanto, enxergarmos o mundo em uma perspectiva Bíblica é o que nos vai levar a achar a verdade e viver segundo Cristo.

METANARRATIVA BÍBLICA DO MUNDO

     Metanarrativa é uma narrativa que conta a história da humanidade. Como cristãos, precisamos agarrar à verdade central como centro a Palavra de Deus, e consequentemente, a narração da história do mundo está na Palavra de Deus. As Escrituras nos revelam pontos importantes na história da humanidade que o homem precisa entender e abraçar pra que viva de forma coerente com seu sistema de crenças. As Escrituras nos fornecem ensinamentos sobre o mundo, o homem, as coisas e tudo que há. Se acreditamos que as Escrituras é a verdade e que ela deve ser a nossa cosmovisão (sistemas de crenças), então, precisamos nos guiar por ela.
      Através da Bíblia vemos uma sequência de temas principais pelos quais Deus guiou a humanidade desde o início. Eles são: criação, queda, redenção e consumação. Esses são os chamados quatro pilares da história da humanidade.
       O início de tudo se deu na criação. Na criação foi onde Deus criou o homem e tudo que há na terra. E Deus, por ser o criador e dono do que Ele fez, por direito, ele colocou regras em tudo que fez. Regras no homem, na natureza, etc. Alguns conceitos importantes que às vezes esquecemos de explicar ou estudar, ou então não damos nem valor por achar que são apenas dizeres históricos, nós esquecemos. Entretanto são regras fundamentais. Esses princípios são: casamento. Deus criou homem e mulher, portanto, o casamento deve ser heterogâmico. Diz também que “deixará o homem seus pais e ele e sua mulher se tornaram uma só carne”, ou seja, o casamento deve ser a dois e o sexo tem que ser dentro do casamento. Hoje vemos o mundo virando de cabeça pra baixo: casamentos totalmente desestruturados. Porém, qual a visão correta acerca disso? Aí é onde está a importância da cosmovisão. Precisamos enxergar tudo de acordo com os “óculos” que o Senhor nos deu, para que em tudo glorifiquemos a Ele. Poderia passar um bom tempo escrevendo sobre vários princípios que foram colocados por Deus na Criação, mas não o farei, pois quero dar apenas uma visão geral de como precisamos ver o mundo.

      Depois da criação, temos o relato da queda. Deus criou tudo e colocou o homem para governar tudo o que Ele tinha criado. Fazendo do homem co-administrador da criação. Entretanto, Deus estabeleceu limites para homem. Ele disse: “Não comas do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal.” Mas, não foi isso que o homem fez, e a partir daí, depois que o homem comeu do fruto, ele se tornou maldito. O homem não mais andava com Deus, agora ele estava no pecado. E desde Adão até hoje tem sido assim. Nós nascemos no pecado e estamos em completa rebelião contra Deus, até que Ele tenha piedade de nós e derrame sua graça e misericórdia em nossas vidas. Até que isso aconteça, estaremos em apuros. O fato é que o ser humano precisa saber qual o seu lugar. O mundo diz que o homem precisa buscar no seu interior o que é bom, precisa buscar no seu interior forças pra vencer as batalhas, quando, na verdade, a parte mais podre do homem é o de dentro. O homem não pode buscar no seu coração o que não tem. Não tem bondade, não tem nada de bom. Quando vemos o mundo de uma cosmovisão cristã, entendemos quem realmente somos. João Calvino afirmou muito bem quando disse: “O homem é uma fábrica de ídolos.” Deus criou o homem com eternidade dentro de si, por isso que ele busca algo além dele mesmo. O problema é que às vezes é totalmente fora da verdadeira eternidade. Se ao menos nossa sociedade entendesse quem somos, talvez muitas coisas não seriam como são.

      Depois da queda, por amor a Sua criação, Deus providencia redenção. Redenção aquela que só é encontrada em Cristo. Não apenas redenção para as pessoas, mas também para toda a criação. Precisamos ter consciência disso: Deus providenciou salvação. As pessoas têm pensamentos acerca da redenção totalmente falsos. O meio pelo qual as pessoas acreditam na redenção é falso. Algumas creem que a redenção da sociedade e do mundo vem através da educação, outros através da cidadania, outros através da moralidade, entre outros. A quem você perguntar, perceberá que essa pessoa tem alguma visão acerca da redenção. Na verdade, as pessoas têm consciência de que precisamos de uma redenção, seja ela qual for. O que precisamos fazer é mostrar a redenção verdadeira. As Escrituras, a cosmovisão cristã, nos mostra onde o mundo terá realmente a redenção, e não será fora de Cristo. A redenção de tudo está em Cristo. Ele é o centro, Ele é quem redime, Ele é quem salva, Ele é quem transforma. Ao olharmos para o mundo e nos agarrarmos a Cristo como única esperança, é o que nos vai fazer andar segundo a Sua filosofia, ou seja, segundo o que a Palavra do Senhor nos diz para andarmos. Portanto, a redenção é central na história da humanidade, e consequentemente, central para nossa vida como cristãos nesse mundo.

       Por fim, temos o cumprimento de todas as promessas que a redenção nos proporciona: a consumação. Pilar esse que é a esperança de todos nós. O sistema de ideias e pressupostos do mundo nos aponta para uma consumação da qual nós somos os autores, mas essa visão errônea é seguida de um entendimento errado acerca da queda. A partir do momento que entendermos a queda, saberemos que nada da consumação pode partir de nós. Na verdade, tudo da consumação parte da redenção. O que nos leva a consumação verdadeira, a crença nessa verdade é acreditarmos na redenção verdadeira. Cristo é a esperança da consumação. Quando tudo acabar, vai ser por Cristo, para Cristo. A criação, a queda e a redenção apontam para a consumação em Cristo Jesus,  o centro de tudo.

      Portanto, nós como cristãos devemos abraçar os principais pilares da história do Senhor para humanidade. A criação, queda, redenção e consumação apontam para como Deus direcionou a humanidade a viver. Quando entendermos isso, veremos o quanto nossas vidas irão ser mais coerentes com a fé Cristã e com a Palavra do Senhor. As Escrituras, acima de tudo, nos guiando na verdade que devemos andar e nos mostrando a cosmovisão correta a respeito do mundo.

quarta-feira, 13 de março de 2013

BREVE APRESENTAÇÃO DO AMILENISMO


Por Danyllo Gomes


A volta de Cristo. Um tema que apesar de tantas divergências, é de grande importância para a vida da igreja. É uma doutrina que abraça o coração do povo de Deus e os faz ter esperança num Cristo que já veio, e que voltará. A esperança do Cristão, ou é a morte e o encontro com o Senhor, ou a Sua volta. De ambos os lados temos a felicidade e a esperança de estarmos com Ele. Com Aquele que “por meio Dele e para Ele foram” Deus fez todas as coisas.
A escatologia é o estudo das ultimas coisas, do alvo do plano de Deus, da consumação da história, entre outros, ou seja, é a matéria onde é estudado a respeito sobre: como será o fim? Cristo voltará? Como Ele voltará? Ele irá reinar por mil anos literalmente, ou apenas simbolicamente? Dentre essas perguntas tantas outras surgem nesse assunto que é tão bom e gostoso de ser estudado. Eu, particularmente, tenho um grande apreço por esse assunto, porque foi por meio dele que meus olhos se abriram para o verdadeiro evangelho. A partir dele minha busca pelo conhecimento do Senhor cresceu. Portanto, além de ser um assunto de esperança para o povo de Deus, também é um assunto que desperta uma certa curiosidade, e Deus, pela sua soberania pode levar pessoas a se interessarem mais a partir de assuntos como esse, como foi meu caso.
Então, qual a importância deste assunto para nós? A importância é saber que as promessas do Senhor nunca falham, que podemos e devemos ter esperança num Deus que enviará Seu filho mais uma vez, como já o fez no passado. Porém, com a consciência que a volta de Cristo será com um caráter diferente da primeira vinda. Na primeira vinda ele veio em amor, porém na segunda virá como reto juiz.
No estudo da escatologia temos uma divisão de assuntos que nos ajuda a entender melhor cada área. Temos a escatologia individual/pessoal que estuda: a morte; o estado intermediário, a ressurreição; céu; inferno e tantos outros assuntos que são tratados de forma pessoal. E do outro lado temos a escatologia geral/cósmica que estuda as ultimas coisas em relação ao mundo, como, por exemplo: volta de Cristo; o milênio, novos céus e nova terra. Neste estudo estarei apresentando apenas uma área da escatologia cósmica, que será o milênio.
Antes de entrarmos no assunto específico do amilenismo tentarei dar uma explanação geral e rápida das outras correntes para entendermos por completo.

  • Pré-milenismo:

Os pré-milenistas, antes de tudo, seguem uma linha de interpretação mais literal das Escrituras. Portanto, as conclusões que são feitas acerca desta posição, grande parte delas, são argumentadas nos textos bíblicos de forma literal. É importante discernirmos isto para termos um melhor entendimento de como há duas interpretações tão diferentes em um texto só.
O coração do pré-milenismo se dá na crença de que o reino terreno de Cristo será feito pelo próprio Jesus Cristo em um período de aproximadamente mil anos onde Cristo, presentemente em carne e osso, estará reinando na terra durante esse tempo. Portanto antes do milênio começar Cristo deverá ter voltado. Sua crença de baseia no texto de Apocalipse 20:4-6.
Dentro dessa ideia temos os seguintes pensamentos/características desta linha:
- haverá uma ressurreição antes do milênio (entende-se então que é depois da tribulação, porque o milênio ocorre depois da tribulação), e depois dos mil anos haverá a ressurreição dos descrentes.

- o milênio é considerado um reino futuro, que ainda irá acontecer.
- acredita-se que tudo se iniciará com o “evento cataclísmico” da volta de Cristo
- o milênio será um período de paz mundial, harmonia universal (inclusive com os animais). Período que os santos reinarão na terra.
No meio pré-milenista há outra divergência quanto ao lugar de Israel no reino milenar. As posições são:
- dispensacionalismo: acreditam que todas as promessas que foram feitas a Israel vão ser cumpridas em Israel (nação).
- não-dispensacionalistas pré-milenistas (pré-milenistas históricos): acreditam que Israel herdará as promessas sim, mas estando na igreja.
De forma geral esse é o pensamento dos pré-milenistas. Como o meu foco aqui não é expor todas as linhas, mas apenas explicar mais detalhadamente o amilenismo, não vou aprofundar.

  • Pós-milenismo

Diferentemente do pré-milenismo, o pós-milenismo não observa os textos bíblicos a respeito deste assunto de forma tão literal. Os pós-milenistas interpretam esses textos de forma mais simbólica.
A visão pós-milenista é uma visão conhecida como “otimista”, pois acreditam que a pregação do evangelho obterá um sucesso tão considerável que o mundo será convertido a Cristo. O reino de Cristo completará e será universal em toda a terra.
Características/pensamentos desta visão:
- Segundo o texto de Marcos 3:27, eles acreditam que na primeira vinda de Cristo Ele amarrou o valente, portanto, agora o evangelho está “livre para dominar todo o mundo”.
- normalmente são preteristas, ou seja, acreditam que os eventos de Mateus 24 e 25 e os eventos descritos no livro de Apocalipse se cumpriram no primeiro século da era cristã.
- acreditam que o reino está crescendo de forma gradual (otimismo) segundo Mateus 13.
- Entendem que o milênio é um período prolongado de tempo em que Cristo, embora ausente, Ele reina sobre o seu povo aqui e agora, e este reino está tendo sucesso. Está se expandindo. E o objetivo é que o reino de Cristo tome toda a terra.

  • Amilenismo

O termo “amilenismo” significa literalmente “não-mil anos”. A posição não defende a ideia de que a Bíblia fala que existe mil anos literais (pré-milenismo) e nem de que será um período de paz, tranquilidade e justiça sobre a terra antes do retorno de Cristo. O amilenismo defende a crença de que o milênio citado em Apocalipse 20 refere-se ao período entre a primeira vinda e a segunda vinda de Cristo, ou seja, os nossos tempos.
O livro de Apocalipse precisa ser entendido de forma simbólica. Os seus capítulos não retratam acontecimentos consecutivos, mas sim os mesmos acontecimentos retratados de forma diferente. Como evidencia de que o livro se apresenta de forma figurada temos uma grande quantidade de números. Os números requerem uma interpretação mais figurativa no contexto de apocalipse, portanto entende-se que o livro precisa ser interpretado de forma figurada. E além dos números também existem várias simbologias.
O diabo hoje tem um poder limitado. No milênio Satanás estará preso; esse é o ensinamento bíblico. Porém devemos entender também que hoje, com o diabo no mundo, com sua influencia sobre as pessoas, seus poderes estão totalmente limitados. Ele tem muitas maldades em mente a fazer, porém ele não tem o poder suficiente para fazê-lo, e por isso está limitado. Esse é o sentido da prisão de Satanás quando se refere ao milênio. Desde o tempo da vinda de Cristo, onde Ele amarrou o valente, até a Sua volta ele estará preso, limitado; até que Cristo volte gloriosamente e o mande para o lago de fogo.
O irmão Cleómines A. F. descreve muito bem em que sentido Satanás será solto, ele diz: Esta limitação, entretanto, terá fim, de certo modo, isto é, ele será solto (ou,quem sabe já esteja?); e quando for solto, isto será concomitante com a grande tribulação (MT 24.29-30), com a apostasia (II Ts 2.8), e isto por breve tempo (Ap.20.8), na iminência da volta do Senhor, que descerá dos Céus e destruirá o Anticristo e seus aliados. E então se seguirão o novo e a nova terra, onde, em justiça, habitaremos com o Senhor não por mil anos,para sempre (I Co 15.52).
Entende-se portanto que o milênio consiste no reinado espiritual de Cristo no Seu povo. Isto ocorreu na primeira vinda de Cristo onde o valente foi amarrado, e culminará na Sua volta em poder e glória como juiz. Além disso também existe o texto de 2 Pedro 3:8 que ele nos diz que “um dia para o Senhor é como mil anos, e mil anos como um dia.”. O texto é claríssimo ao afirmar a não-literalidade dos mil anos. Algumas pessoas vem com o argumento: “Ah, se realmente formos considerar isso vamos ter que acreditar que Deus não criou o mundo em 6 dias, porque um dia pra ele é como mil anos”. Esse pensamento está totalmente equivocado. O contexto deste texto se dá exatamente no assunto da Sua vinda, portanto não há problema em se referir aos mil anos de Apocalipse como não literal e continuar crendo que o mundo foi criado realmente em 6 dias literalmente. A ideia se aplica ao assunto do contexto, não podemos expandir.
A primeira ressurreição de Apocalipse 20 é entendida como sendo a ressurreição espiritual dos incrédulos. Em toda a Bíblia é apresentada a ideia de apenas uma ressurreição, como, por exemplo: Jo 5:28-29, Dn 12:2; At 24:15.
Por fim, Berkhof faz uma análise interessante acerca do suposto convívio entre pessoas glorificadas e pecadoras. Ele diz: “É impossível entender como uma parte da velha terra e da humanidade pecadora poderá coexistir com uma parte da nova terra e de uma humanidade já glorificada. Como poderão os santos em corpos glorificados ter comunhão com pecadores na carne? Como poderão os santos glorificados viver nesta atmosfera sobrecarregada de pecado e em cenário de morte e decadência?”
Apesar de ser um assunto complicado e longo, tentei ao máximo passar a visão simples e enxuta da visão amilenista das Escrituras. Depois disto mostrado, espero que a cada dia que passe tenhamos mais confiança no Deus que uma vez prometeu o messias e cumpriu a promessa. Esperemos nele agora a volta do glorioso filho Cristo Jesus para nos levar e viver com Ele eternamente. A nossa confiança não está apenas baseada no futuro, mas no passado também.
Soli Deo Gloria.